sexta-feira, setembro 21, 2007

o medo de perder o medo

outro dia estava eu cortando caminho pelo parque farroupilha. o parque da República. de bancos de fins do século XIX. de sociabilidade da burguesia emergente sulriograndense. com passarelas sobre um pequeno lago, hoje sujo e fétido. com árvores que te fazem esquecer o gosto do ar urbano. o melhor adjetivo para ele hoje seria democrático. mas na verdade ele nasceu republicano. e sua suposta democracia só mata a fome da alma "popular" em dias de domingo e feriados. principalmente nos que têm passe-livre para toda população. sim. passe-livre. quanta democracia. pois bem. estava eu esquecido do trânsito urbano. perdido em meio ao som quase provinciano do parque até que fui surpreendido por um corredor que vinha logo atrás de mim. o senhor estava simplesmente tentando, em seu tempo livre, curar o coração de suas gorduras ingeridas ao longo de sua vida de gaúcho. ou exercitando seu pulmão podre de 20 anos de acondicionamento de nicotina. ou sei lá o que. o que interessa, e isso sim é instigante, é que eu me virei assustado e tenso. talvez pensando que estava sendo abordado por um possível corpo que escolheu a via do liberalismo cotidiano da urbe: saques e motins. sim. era isso. esqueçam o talvez. o homem chegou a pedir desculpas, sem parar sua corrida pela recuperação de sua saúde. ele percebeu claramente minha feição de tensão. refletindo sobre o ocorrido percebi o quanto vivemos sob tensão. todo o tempo. estava eu em um parque, cortando caminho para chegar em minha passagem de porto alegre. e me dou conta do quanto o mundo moderno (muitos diriam com a boca cheia: pós-moderno, seu “out”!) nos deixa tensos. e a tensão vem de todos os lados. desde a televisão até na literatura. sim. até nesta tão gostosa fuga. tensão em kundera, tensão em bukowski. não é a boa tensão. aquela sobre a qual realizamos nossas práticas cotidianas e que nos faz mover. mas a tensão no sentido de fobia. de medo. medo das ruas. medo da sombra que vem logo atrás de você. sentimento criado. porém sentimento sentido. vivido. chegam a criar até mesmo uma instituição para afastar esse medo. por isso não é de se assustar que a polícia declare que já fez por volta de 40 mil detenções e que espera chegar aos 70 batendo o número do ano passado. e deixando como eles disseram todas as famílias tranqüilas. porque as famílias têm medo. e deixar sua liberdade de ir e vir sob a guarda da brigada militar. ainda sou totalmente contra a instituição da polícia. mas me vi inserido por instantes na prática social que este mundo nos ensinou. pelo menos em parte dela, a do medo. e nossa sociedade parece ter medo de perder o medo. porque desaprendemos a viver sem a polícia. porque ela parece algo que está na ordem natural das coisas.
vivendo na utopia de perder o medo e encarar todos como senhores de seus destinos posso até me deparar com uma alma que esteja a ponto de agir segundo a ordem que o medo neoliberal nos ensinou. mas aí é outra história. porque tudo pode acontecer. e eu prefiro romper com o medo urbano.
uma pessoa que vive de sonhos. e sonhos envelhecem... ah, como envelhecem! ou foi só a alma amargurada que envelheceu durante sua vil existência? não sei, talvez no futuro alguém dirá: "um gordo que procurou viver..." triste, mas passível de ser verdadeiro.
enquanto espero não ser como eles, não tenho tanta certeza de que não sou.

3 comentários:

. disse...

Você voltou a escrever!!! que bom, sentia falta desse palavriado que você escrivinhava nessas páginas de blog. Sinto mais saudades suas e destes teus medos tolos. Medo de que? Nada lhe será tirado nem dado. É tudo seu, é seu direito natural... pode pegar que é seu!

rcbo disse...

a tensão lhe deixa ligado, faz vc encontrar coisas surpreendentes até dentro de vc mesmo, mas na maioria das vezes lhe faz encontrar coisas q não existem e q te limitam tanto quanto as coisas reais q verdadeiramente lhe ameaçam.

Helena disse...

Que alegria entrar hoje no seu blog e encontrar tanta coisa nova .. tanots sentimentos expressos em letras.. tanta riqueza pra ossas almas já tão combalidas pelas vicissitudes dos tempos (modernos ou pós-modernos qe seja!)
Estávamos precisando de você
Beijos da Helena